domingo, 4 de setembro de 2011

O PAPEL SOCIALIZADOR DA CIÊNCIA: UM NOVO TRATADO PEDAGÓGICO.


Valdenice Hart [1]
Janete Rosa da Fonseca[2]

RESUMO: Neste trabalho, foi realizado, um levantamento de dados, sobre a realidade tecnológica e científica   da educação básica do município de Sorriso - MT,  com o objetivo de gerar uma reflexão, sobre o desenvolvimento daquela para uma possível superação das desigualdades sociais encontradas no município.
Palavras – Chave: Tecnologia, Ciência, Desigualdades sociais, Educação Básica.


A evolução do conhecimento humano e a ciência proporcionam aos povos que participam de fato de seu desenvolvimento uma melhor qualidade de vida. Isto é alcançado mediante a sofisticação da atividade humana em seus aspectos sociais, econômicos, culturais e artísticos. Os povos que não participam do desenvolvimento científico estão, em grande medida, com déficits de qualidade de vida e são economicamente subalternos em relação aos povos que lideram os avanços do conhecimento.
É possível afirmar que uma nação tem a incumbência de disponibilizar condições favoráveis de sobrevivência para seus habitantes, para isto é relevante diminuir com a disparidade entre classes e possibilitar a ascensão social dos cidadãos. Todos devem ter acesso a uma educação de qualidade e o país necessita investir em ciência e tecnologia, para, assim alcançar o seu desenvolvimento, dando mais condições de vida digna a seu povo.
O processo de produção do conhecimento torna-se mais competitivo, e sofre significativas transformações na sua organização social, que podem contribuir para ampliar as desigualdades existentes no contexto contemporâneo (GIBBONS, 1994). Quanto maior for o afastamento da ciência menor será o desenvolvimento do país e pior será a qualidade de vida do seu povo. Se a meta é a diminuição das desigualdades sociais uma das alternativas é aperfeiçoar o desenvolvimento tecnológico - cientifico.
Diante das dificuldades de compreender o mundo sem o conhecimento dos princípios básicos da ciência e da tecnologia, torna-se fundamental o aumento do capital cultural  da população através de uma educação científica (TOFFLER, 1970). Esta educação voltada para o aprimoramento da ciência prepara o aluno para o futuro tecnológico, garantindo o desenvolvimento nacional. Para o sucesso desta alternativa julga-se indispensável o desenvolvimento de pesquisa dentro das instituições de ensino, desde a educação básica até os cursos de nível superior.
A educação é uma resposta para a busca incessante do homem e é possível para o homem porque este  é um ser  inacabado e sabe-se inacabado. Isto o leva a perfeição. A educação implica uma busca realizada por um sujeito que é o homem. O homem deve ser o sujeito da própria educação e não o objeto (FREIRE, 1979).  Consciente das indagações sem respostas que impulsionam à elaboração de pesquisas e consequentemente a significativa importância desses resultados para a evolução humana, este artigo objetiva gerar uma reflexão sobre a aplicação e o desenvolvimento da ciência  e da tecnologia no âmbito da educação básica, bem como a possível utilização desta para o aplainamento  das disparidades sociais.


MATERIAL E MÉTODOS

No período de 24 de julho a 04 de agosto de 2008 foram distribuídos questionários em sete escolas do município de Sorriso – MT, sendo três municipais, duas estaduais e duas particulares. Optou-se pela pesquisa de cunho exploratório e qualitativo,  com questões abertas e amostragem não probabilística por julgamento (MATTAR, 1996).
 A escolha da amostragem foi definida de forma a contemplar as diferentes realidades educacionais nos três âmbitos (municipal, estadual, privado) da educação básica, uma vez que o município dispõe de quatro escolas da rede privada, três  da rede pública estadual e 28 da rede pública municipal. Todos os questionários foram respondidos pelos gestores destas instituições de ensino.




RESULTADOS E DISCUSSÃO

As escolas estão preocupadas com a adaptação as inovações tecnológicas e cientificas, porém nem todas dispõem de acesso a estas tecnologias (Figura 1). Estes índices demonstram certa deficiência do sistema de inovação brasileiro, que pode ser identificada tanto pelo percentual relativamente baixo de gastos com Pesquisa e Desenvolvimento no país, como pelo desperdício de oportunidades oferecidas pela infra-estrutura científica ao setor produtivo (ALBUQUERQUE & SICSÚ, 2000).
            Das escolas pesquisadas, a rede privada possui um maior número de laboratórios, que são os de Informática, Biologia, Matemática e Química, havendo ainda carência como, por exemplo, Laboratório de Física. As estaduais possuem apenas laboratório de Informática e de  Biologia, isto causa preocupação já que estas escolas têm um elevado número de alunos matriculados no ensino médio e deveriam ter disponível estes recursos. As municipais têm somente laboratório de Informática, isso pode ser explicado pelo fato destas possuírem apenas Educação Infantil e Ensino Fundamental, mas os laboratórios de Biologia, Matemática contribuiriam para um melhor  aprendizado destes alunos.
            Esta diferença quantitativa de laboratórios, verificada entre as  redes privada, estadual e municipal, revela a existência de disparidades educacionais entre elas, constatando-se que o ensino particular detém uma melhor qualificação tecnológica, ou seja, dispõe de mais recursos para um eficaz desempenho do aprendizado. Logo os alunos que estudam nestas instituições estarão  melhor preparados para a disputa de vagas em  cursos de nível superior e, posteriormente, no mercado de trabalho.  

Figura 1. Escolas da rede Privada, Estadual e Municipal de Sorriso - MT, e a porcentagem de Laboratórios. Sorriso, FAIS, 2008.
            As diferenças na distribuição regional dos recursos científicos e tecnológicos são muito acentuadas. Basta salientar, por exemplo, que 82% dos grupos atuantes em pesquisa, no país, estão nas Regiões Sudeste e Sul. A base técnico-científica instalada no Brasil tem, assim, sua expressão mais potente nessas duas regiões, para onde é canalizada a maior parte dos investimentos em ciência e tecnologia realizados pelo governo brasileiro (BARROS, 2000). É cabível salientar que esta pesquisa abrange a educação básica, quando o maior investimento neste aspecto no Brasil é no ensino superior e que ainda é bastante tímido nesta região.
Todavia as escolas estão realizando projetos de pesquisa, principalmente na rede privada, porém, é sabido que ainda não estão em um patamar alto de produção cientifica, o que pode se dar em virtude da falta de profissionais com esse perfil, já que a região centro-oeste não dispõe de um número considerável de professores-pesquisadores ou da falta de recursos financeiros. Na mensuração dos projetos de pesquisa houve alguns equívocos nos levantamentos de dados, pelo fato da não diferenciação entre projetos de pesquisa e projetos culturais e sociais. Isso induz a busca eminente de formação de professores- pesquisadores, que tenham a didática de inferir no aluno o desejo pelo conhecimento, desvendando o novo e o desconhecido.
Um fator de importância no âmbito cientifico é a divulgação dos trabalhos realizados, requisito que o universo pesquisado tem contemplado com sucesso, pois estes divulgam as pesquisas por meio de Feiras do Conhecimento, Amostra Pedagógica, Amostra Científico – Cultural e Workshopping. O que ainda inquieta é a pequena quantidade de escolas que divulgam os trabalhos via computacional(informaticamente), o equivalente a 15% da amostragem, isto respalda o quão aquém está o acesso dos alunos e da comunidade em geral a está inovação tecnológica.
Existe participação dos alunos em eventos como a Olimpíada da Matemática, Olimpíada de Português, Concurso de Poesias, em todas as escolas.  Também há incentivo para a participação daqueles, através de aulas extras, e motivação. Julga-se relevante o incentivo financeiro para facilitar o envolvimento dos alunos.
            Pode-se perceber com os dados, obtidos, que as escolas da rede privada ocupam um lugar de destaque no que tange as questões de tecnologia e inovação, consequentemente os alunos do setor público estão em desvantagem, tendo maiores dificuldades de ascender socialmente.
Também é importante reconstituir uma visão radical da alfabetização que gire em torno da importância de nomear e transformar as condições ideológicas e sociais que solapam a possibilidade de existirem formas de vida comunitária e pública organizadas em torno dos imperativos de uma democracia crítica. Precisa-se fazer mais do que esclarecer o alcance e a natureza do significado do analfabetismo, é fundamental desenvolver uma prática pedagógica que ofereça uma linguagem de esperança e transformação (FREIRE, 1990).  O poder mediatizador da ciência sobre as desigualdades sociais deve e precisa ser considerado, por que o processo de desenvolvimento que os alunos irão experimentar fará com que os mesmos busquem através dessa ferramenta, alternativas de reversão de suas condições.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Devemos aceitar ou refutar os resultados de uma pesquisa que nos mostra que existem falhas em nosso processo de educar focados em ciência e tecnologia? Percebemos que podemos e devemos nos utilizar dessas tecnologias para romper as desigualdades, mesmo aquelas que dizem respeito aos profissionais da educação e seu preparo para lidar com elas.
Novos horizontes, novas possibilidades descortinar-se-ão diante de seus olhos e os remeterão a uma busca constante. Pois na verdade o acesso ás tecnologias permite um momento de descoberta e a escola passa a ser definidora de situações.
Para tal, quando falamos em desigualdades e em marcação das diferenças sociais, devemos lembrar que isso implica também em sentimentos e atitudes e que até então a prática da desigualdade perpetuou-se pelas relações de poder existentes, pois, tecnologias não são só hardwares mas sim softwares e que novas metodologias de ensino também podem ser consideradas tecnologias.
E ainda assim se continuarmos pensando que tecnologia não reduz desigualdades sociais devemos lembrar que conhecimento sim. E a forma como se faz conhecimento é tecnologia.






REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALBUQUERQUE E. M; SICSÚ J. Inovação institucional e estímulo ao investimento privado. São Paulo em Perspectiva, 2000. p. 109.

BARROS F. A. F. Os desequilíbrios regionais da produção técnico – cientifica.  São Paulo em Perspectiva, 2000. p. 12-14.

FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. 24° edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

FREIRE, Paulo, MACEDO, Donoaldo. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra. 3° edição.  Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

GIBBONS, M. et alii. The new production of knowledge. Londres, Sage, 1994.

MATTAR, Fauze N. Pesquisa de Marketing. 6° edição. São Paulo: Atlas, SP, 1996.

TOFFLER, A. Future Shock. Toronto Bantam Book, 1970.

http://www.sorriso.mt.gov.br/site/secretarias/index.php?codigo=4&area=missao
Data de acesso: 07/08/2008 ; 00:35h


[1] Acadêmica do curso de Pedagogia da Faculdade de Sorriso – FAIS – MT.
[2] Professora orientadora – Pedagoga e Mestre em Educação.

Integração na aprendizagem nos domínios cognitivo, psicomotor e afetivo na educação para a sustentabilidade: uma aplicação em uma Instituição de Ensino Superior do Mato Grosso.

Ms. Antonio Gil da Costa Júnior
Coordenador do curso de Administração da Faculdade de Sorriso
gil@fais.com.br
Ms. Janete Rosa da Fonseca
Coordenadora do curso de Pedagogia da Faculdade de Sorriso
janete@fais.com.br

RESUMO                                                                                              
Com a crescente preocupação mundial a respeito dos impactos ambientais, autores e organizações mundiais clamam por mudanças significativas no ensino superior no contexto da educação para a sustentabilidade. Como alternativa, sugere-se o modelo ATS de aprendizagem transformativa para a sustentabilidade, uma metodologia adaptada à realidade brasileira do modelo TSL – transformative sustainability learning.
A ATS é uma série de objetivos de aprendizagem correspondentes aos domínios cognitivo (mente), psicomotor (mãos) e afetivo (coração) que tem o propósito de facilitar as experiências pessoais e em grupos, resultando em profundas mudanças no conhecimento, habilidades e atividades relacionadas à justiça econômica, social e ambiental.
Este modelo foi aplicado no Curso de Administração da Faculdade de Sorriso - MT e continua em andamento.  Os primeiros resultados foram positivos, atingindo o objetivo final da aprendizagem transformativa no domínio comportamental.
Palavras-chave: Educação. Aprendizagem Transformativa. Sustentabilidade.

Introdução
Desde 2005 a Responsabilidade Social passou a ser uma das dimensões do Instrumento de Avaliação do Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior). A dimensão considera responsabilidade social em itens particulares: inclusão social, desenvolvimento econômico e social, defesa do meio ambiente, da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural. Estes itens isolados demonstram o que o Estado espera do Ensino Superior. Mas “se por um lado é clara a natureza da responsabilidade social na governança das instituições de ensino enquanto empresas, por outro seu significado para a tríplice função universitária de ensino, pesquisa e extensão ainda é motivo de discussão (BORLAN e MOTTA, 2008)”.
A educação superior nas sociedades ocidentais fragmentou o conhecimento em disciplinas. Esse modelo de educação tem suas raízes no racionalismo, uma doutrina em que o conhecimento é derivado de uma compreensão “baseada em evidências” e de “rigor científico” do mundo (LAMBKIN, 1998). A dominância do racionalismo em detrimento das qualidades humanas como intuição, senso comum, criatividade, ética, memória cultural e espiritualidade, serviu para dividir o conhecimento em elementos cada vez menores.
Como diz Orr (1992), é hora de se perguntar o quê se precisa saber para viver humanamente, pacificamente e de forma responsável na Terra, direcionando as pesquisas neste ponto. Desta forma, pode-se mudar o rumo da educação parando-se de ensinar a “insustentabilidade” (perpetuação da crise ambiental e social) e transformando a perspectiva pedagógica para ensinar a sustentabilidade (justiça socioambiental). Para se mover do modelo de reprodução dos males sociais para o ensino da sustentabilidade, requer-se a transformação para novas formas de aproximar a educação à vida.
Esta pesquisa é baseada em duas premissas. A primeira é que os locais de estudo, trabalho e diversão dos acadêmicos são os centros de suas experiências, que ajudam a ensiná-los como o mundo funciona e quais seus papéis neste planeta (GRUENEWALD, 2003). Para uma melhor contextualização, a educação para a sustentabilidade deve ser situada tanto na Instituição de Ensino Superior quanto no ambiente da comunidade.
A segunda premissa é que as Instituições devem assumir um papel ativo, consciente de sua responsabilidade nos espaços local, regional e global (GRUENEWALD, 2003). Para alcançar esta premissa a missão e objetivos da instituição devem ser examinados e até mesmo reconstruídos.
Contexto
Os anos de 2005 a 2014 foram instituídos pela ONU como a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. Ao instituir a preocupação com o desenvolvimento sustentável, a Década almeja melhorar a qualidade do ensino, facilitar a troca de experiências entre os diversos atores envolvidos e aumentar a atenção pública ao assunto. A definição de educação para o desenvolvimento sustentável ultrapassa a questão ambiental (como água, mudanças climáticas, biodiversidade etc.) e agrega estes conceitos a aspectos econômicos para o desenvolvimento (luta contra a pobreza, transformações sociais, eco-turismo etc.) e a valores sócio-culturais, tais como igualdade de gênero e promoção da diversidade cultural (UNESCO, 2005).
Espera-se que neste período seja construída uma ponte entre a academia e as necessidades da comunidade, assim como a necessidade de promover a sustentabilidade na educação superior de uma maneira que afete positivamente a sociedade e a biosfera.
Assim a aprendizagem transformativa assume o papel de conduzir as pessoas a mudar suas concepções e visões do mundo. Processos de reflexão crítica das “concepções e pontos de vista” são fundamentais para este aprendizado, que inova processos de (re)construção do conhecimento baseado em experiências de vida até chegar a novas formas de pensar e viver (MOORE, 2005). Busca-se com esta educação, fundamentada na pedagogia crítica, uma transformação na sociedade.
O modelo de Aprendizagem Transformativa para a Sustentabilidade
O modelo ATS de aprendizagem transformativa para a sustentabilidade é uma metodologia adaptada à realidade brasileira do modelo TSL – transformative sustainability learning (SIPOS et al., 2008).
Consiste de uma série de objetivos de aprendizagem correspondentes aos domínios cognitivo (mente), psicomotor (mãos) e afetivo (coração) que tem o propósito de facilitar as experiências pessoais e em grupos, resultando em profundas mudanças no conhecimento, habilidades e atividades relacionadas à justiça econômica, social e ambiental.
Assim a ATS procura contribuir para a sustentabilidade através da articulação e interação entre as atividades pedagógicas centradas no princípio mente, mãos e coração.
A evidente relação entre educação para a sustentabilidade e educação transformativa faz da ATS uma ferramenta pedagógica útil de transformação cultural, de aprendizagem e ensino, que se preocupa com “o quê é ensinado, como ocorre o ensino e como o que é ensinado é aprendido”.
O princípio mente, mãos e coração
Mente, mãos e coração representam os domínios cognitivo, psicomotor e afetivo de aprendizagem (BLOOM et al., 1964). A ATS é uma aprendizagem que facilita as experiências pessoais resultando em profundas mudanças no conhecimento, habilidades e atitudes relacionadas ao aprimoramento da justiça econômica, social e ambiental.
O resultado da aprendizagem deriva do conhecimento, habilidades e atitudes adquiridas por meio da participação em uma atividade educacional. A “Taxonomia de Bloom” (BLOOM et al., 1964) é utilizada para o desenvolvimento dos objetivos de aprendizagem da ATS. Assim, de forma simplificada, o modelo ATS integra os processos de aprendizagem nos participantes via mente (domínio cognitivo; engajamento através de estudos acadêmicos e compreensão da cidadania e sustentabilidade global), mãos (domínio psicomotor; promovendo a passagem da teoria para o desenvolvimento de habilidades práticas e atividades físicas como construir, pintar e plantar) e coração (domínio afetivo; valores e atitudes são convergidos em comportamento, como desenvolvimento de responsabilidades coletivas e individuais para com a comunidade).
O objetivo desta integração é atingir o que Hauenstein (1998) se refere como o domínio comportamental, o objetivo final da aprendizagem transformativa. Esta combinação da pedagogia da ATS com a taxonomia educacional de Hauenstein é importante por demonstrar como a sustentabilidade foi assimilada e como é praticada na vida do participante.
Vale ressaltar que a ATS é resultado da implementação de modelos pedagógicos que constam da agenda da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, como a transdisciplinaridade; interdisciplinaridade; e aprendizagem para a sustentabilidade local, através da teoria-prática, pedagogia crítica, educação ambiental, pesquisa-ação, eco-justiça, etc.
O desenvolvimento sustentável no Mato Grosso
O Estado do Mato Grosso é considerado o principal pólo de produção agrícola do Brasil, sendo o principal produtor de grãos. Apenas sua receita com a exportação de soja é responsável por 24,3% da receita nacional advinda das exportações segundo estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (FIGUEIREDO et al., 2004).
            Por se tornar o “celeiro do mundo”, o Mato Grosso, e conseqüentemente suas atividades no agronegócio, passam a ter repercussão nacional e até mesmo global. Como descreve Gomes (2007, p. 22), “o mundo está atento ao Mato Grosso. Toda vez que se pisa na bola por aqui se cria uma barreira ambiental na Europa, que é o grande mercado de nossas commodities agrícolas”.
Em decorrência desse cenário, surgem movimentos que reivindicam mudanças em relação à forma de produzir e pleiteiam a sustentabilidade, considerando aspectos, tais como aqueles relacionados à qualidade de vida, meio ambiente, diminuição dos custos dos alimentos e de energia, minimizando ao máximo os impactos no meio ambiente (OLIVETTE, 2006, p. 8).

            Discutir as questões ambientais do Mato Grosso, como em todo o Centro-Oeste e Amazônia, implica em discutir a ocupação humana e econômica ocorrida a partir de 1973. Primeiro a descoberta do centro-oeste pela construção de Brasília, a partir de 1957. Depois com a ocupação da Amazônia, a partir de 1973 na política “integrar para não entregar” do governo militar da época (RIBEIRO, 2008).
            Esta política, por intermédio do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), estimulava os ocupantes que tomassem posse das suas áreas pelo desmatamento. Os excessos cometidos nesses últimos 35 anos deixaram uma profunda marca em grande parte da sociedade. Um fator cultural que dificulta a implementação, e até mesmo, a conscientização da sustentabilidade.
A ATS na prática
A questão histórica e cultural que impede a conscientização da sustentabilidade no Mato Grosso é bem visível no município de Sorriso, localizado no médio-norte do estado. Esta situação não ocorre apenas com os colonizadores, que chegaram à região a mais de 25 anos. As gerações nascidas no município perpetuam em muitos pontos o pensamento dos pais.
Pensando nisso, o modelo da ATS foi implementado no Curso de Administração da Faculdade de Sorriso. A primeira etapa foi colocá-lo em prática no semestre em que a Gestão Ambiental está inserida. A segunda etapa será estender este modelo pedagógico a todo o Curso.
As ações aplicadas na primeira etapa seguiram o princípio mente, mãos e coração, e são discorridos a seguir.
  1. Mente: aprendizagem trabalhada por meio de leituras e discussão em pequenos e grandes grupos, realizada em sala de aula com livros, artigos e vídeos profissionais, de reportagens e filmados pelos próprios acadêmicos.
  2. Mãos: por meio de visitas orientadas a campo, os acadêmicos foram estimulados a sentir a natureza e pintar os problemas sociais. Outra ação implementada foi a construção de um projeto de diagnóstico empresarial e plano de ação para melhoria da Mini-usina de soja da Associação dos Amigos da Criança e do Adolescente de Sorriso – MT.
  3. Coração: os acadêmicos foram estimulados a filmar os problemas ambientais e sociais encontrados expondo seus sentimentos. O vídeo então era apresentado em sala, para estimular o domínio cognitivo gerando idéias de como colocar em prática alguma ação, no domínio psicomotor.
Para uma primeira etapa os resultados obtidos foram muito animadores. Tanto para os acadêmicos que aprovaram o modelo de aprendizagem quanto para os pesquisadores, já que a ATS colocada em prática atingiu o objetivo final de aprendizagem transformativa no domínio comportamental de Hauenstein (1998). Espera-se que com a aplicação do modelo na segunda etapa os resultados sejam ainda mais satisfatórios.
Considerações Finais
Este artigo teve como propósito apresentar o modelo ATS, assim como seus princípios, valores e objetivos da sustentabilidade na busca de uma transformação social. Fundamentado no princípio mente, mãos e coração, este modelo tem o propósito de facilitar as experiências pessoais e em grupo resultando em profundas mudanças no conhecimento, habilidade e atividades relacionadas à justiça econômica, social e ambiental.
Este modelo começou a ser aplicado no Curso de Administração da Faculdade de Sorriso e continua em andamento.  A primeira fase foi implementá-lo no semestre em que a disciplina Gestão Ambiental está incluída. Com os primeiros resultados otimistas, a próxima etapa será a implementação em todo o Curso de Administração desde os semestres iniciais até a conclusão. Espera-se assim, a formação de um profissional capacitado para as exigências do mercado profissional e atuante nas causas sociais e ambientais.
Referências
BLOOM, B. S.; MASIA, B. B.; KRATHWOHL, D. R. Taxonomy of Educational Objectives. Nova York: David McKay & Co., 1964.
BORLAN, V.; MOTTA, M. V. Responsabilidade Social no Ensino Superior. Responsabilidade Social, v. 3, n. 3, p. 11-20, 2008.
FIGUEIREDO, M.; BARROS, A.; GUILHOTO, J. Relação econômica dos setores agrícolas do Estado do Mato Grosso com os demais setores pertencentes tanto ao Estado quanto ao restante do Brasil, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/resr/v43n3/27746.pdf>. Acesso em: 22 maio 2008.
GOMES, E. Desmatamento recua. Revista do Mato Grosso, p. 20-33, ago 2007.
GRUENEWALD, D. Foundations of place: a multidisciplinary framework for place-conscious education. American Educational Research Journal, v. 40, n. 3, p. 619-654, 2003.
HAUENSTEIN, A. D. A conceptual framework for educational objectives: A holistic approach to traditional taxonomies. Lanham: University Press of America, 1998.
LAMBKIN, K. The hegemony or rationalism and its influence on organizations. Action Learning Action Research Journal, v. 3, n. 1, p. 3-18, 1998.
MOORE, J. Is higher education ready for transformative learning? A question explored in the study of sustainability. Journal of Transformative Educaction, v. 3, n. 1, p. 76-91, 2005.
OLIVETTE, M. A questão regional no contexto da sustentabilidade frente à competitividade: uma breve reflexão. Informações Econômicas, v. 36, n. 5, maio 2006.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA. Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: < http://www.brasilia.unesco.org/noticias/releases/2005/sustentavel>. Acesso em: 30 out 2008.
ORR, D. Ecological Literancy: Education and the Transition to a Postmodern World. Ecological Applications, v. 10, n. 5, p. 1275-1287.
RIBEIRO, O. Amazônia com métodos. Revista Mato Grosso, p. 30-32, maio 2008.
SIPOS, Y.; BATTISTI, B; GRIMM, K. Achieving transformative sustainability learning: engaging head, hands and heart. International Journal of Sustainability in higher Education, v. 9, n. 1, p. 68-86, 2008.

ANSEIOS DOCENTES, PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM, PARA ONDE OLHAR?


Carlise Pelissari Zacarias de Godoi-UNINOVA¹
Janete Rosa da Fonseca- UNINOVA/FASIPE²
Juliana Zanatta-UNIVOVA³

Resumo: A proposta que trazemos a tona para discussão neste artigo refere-se à necessidade de se desenvolver estudos e pesquisas que possam subsidiar a ação docente frente às dificuldades de aprendizagem. Isto por que se tem plena convicção do papel vital dos professores e suas práticas e entende-se que contribuir com investigações que propicie qualidade a atuação destes profissionais é manter vivo o compromisso com o processo ensino/aprendizagem. O cenário escolhido para realização desta investigação foi uma Escola Estadual no interior do Estado de Mato Grosso, onde se procurou através de uma pesquisa de inspiração etnográfica, analisar como os diferentes atores que circulam nestes espaços educativos convivem com as dificuldades de aprendizagem ali encontradas, qual metodologia por eles é utilizada e como estes profissionais vêem o apoio pedagógico oferecido pela Escola quando do encaminhamento destas dificuldades. Finalmente, além de apresentarmos as principais conclusões obtidas por meio desta pesquisa são apresentadas algumas sugestões de encaminhamentos que permitam reflexões sobre a necessidade de mudanças na formação de docentes para que estes se sintam melhor preparados e consequentemente confiantes quanto a sua atuação em sala no momento de detectar e eleger práticas pedagógicas que se traduzam em reais perspectivas.
Palavras-chave: Aprendizagem. Trabalho docente. Dificuldades. 

Dificuldades de aprendizagem e o espaço de construção do conhecimento

Educar é um desafio, implica parar e reconhecer a necessidade de aprender e de refletir sobre a educação que se pretende oferecer e sobre as condições dessa oferta, no que tange a formação docente e práticas pedagógicas diferenciadas e eficazes. Por isso é necessário que o trabalho educativo vá além do espaço de sala de aula, mas que também possamos refletir sobre os fatores que interferem no processo ensino/aprendizagem que estão presentes em nossa sociedade atual.
Conhecer o aluno dentro de sua realidade como convívio familiar e suas ações diárias são pontos de partida para detectar onde surgem e como podem ser trabalhadas as dificuldades de aprendizagem. Pois nas coisas simples da vida cotidiana, podem constar fontes riquíssimas para descoberta de um procedimento didático adequado.
_______________________________
¹ Acadêmica do 4ºano de Pedagogia da União de Ensino Superior de Nova Mutum-MT
² Pedagoga, Mestre em Educação,Doutoranda em Educação.Docente dos Cursos de Graduação e Pós-             graduação Latu sensu das Faculdades Uninova- Nova Mutum,MT e Fasipe- Sinop-MT.
³Acadêmica do 4ºano de Pedagogia da União de Ensino Superior de Nova Mutum-MT
É indispensável registrar que equipes multidisciplinares, compostas por médicos, pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, professores e demais profissionais envolvidos, cada vez mais, coloquem-se a serviço dos casos de problemas de aprendizagem, colaborando para que as crianças encaminhadas possam desfrutar plenamente dos espaços educativos.
Coloca-se um desafio aos profissionais envolvidos inclusive a escola, de renunciar aos privilégios da visão tradicional e conservadora e começar atuar de forma mais aberta para descoberta de novos conceitos e atuações, visando sempre um estudo integrado que busque uma compreensão global do problema. É necessário que estes profissionais adotem uma postura ética em relação ao aluno, que assim como eles convivem em uma sociedade excludente.
Portanto, diversificar as situações de aprendizagem é adaptá-las às especificidades dos alunos, é tentar responder ao problema didático da heterogeneidade das aprendizagens, que muitas vezes é rotulada de dificuldades de aprendizagens.
Deve-se ter em mente que nem todos os alunos aprendem da mesma maneira e que, portanto as práticas docentes precisam respeitar ritmos, níveis, processos cognitivos, emocionais, orgânicos, familiares, sociais, metodológicos e ainda os de diversidade cultural. Percebe-se que o cotidiano dos professores constitui-se em um constante desafio, pois estas situações são encontradas em um considerável número de alunos que, sem nenhum tipo de deficiência mental, nem privação ambiental, nem sensorial não alcançam o sucesso esperado em suas aprendizagens. Dessa forma nos permitimos perguntar se a formação atual oportunizada aos docentes propicia todos os conhecimentos necessários para identificar e atuar frente às ditas dificuldades de aprendizagem encontradas no espaço educativo e qual o apoio pedagógico oferecido pela instituição Escola quando dessa descoberta.
Considerando esta proposta de pesquisa, o presente trabalho desenvolveu-se em uma sala de terceiro ano de uma escola estadual, sob a observação de acadêmicos (as) do Curso de Pedagogia, contando com a colaboração dos professores da instituição e com o acompanhamento e orientação da professora do curso, pretendeu-se assim desenvolver uma proposta baseada na etnografia.
 Observou-se ainda, além das práticas e anseios docentes que essas dificuldades podem ser desenvolvidas por fatores hereditários, sociais, culturais, pedagógicos, psicológicos e neurológicos. Existem vários conceitos, critérios, teorias e hipóteses que existem como controvérsias que acabam prejudicando o desenvolvimento, compreensão ou quando necessário tratamento adequado.

 Em todas as fazes de formação principalmente nos primeiros anos de vida o individuo ao ser gerado na vida intra-uterina já esta em constante processo de formação até os trinta meses de vida. Podendo assim dentro deste período ocorrer lesões diretas ou indiretas as quais poderão interferir no processo maturacional comprometendo aí o potencial de aprendizagem.
Atualmente, a educação vem passando por profundas transformações, tendo em vista as mudanças constantes que vem ocorrendo no mundo. As novas tecnologias evoluem num ritmo cada vez mais acelerado, e o mundo cientifico também avança constantemente, com novas descobertas e estudos, apontando diferentes metodologias para atuar na sociedade e consequentemente na educação. Diante disso, os profissionais veem-se desafiados a buscarem novos conhecimentos e estratégias de ensino. Faz-se necessário que a comunidade escolar encontre o caminho para a diversidade, engajando as crianças no mundo das diferenças tornando-os verdadeiros cidadãos, isso requer do professor um olhar diversificado para seu planejamento, adequações aos conteúdos e atividades em sala de aula.
        Outro ponto é a importância de se conhecer a história dos alunos, para que os conteúdos a serem estudados estejam de acordo com seus interesses e realidade, já que elas são inúmeras e diferentes na aparência, na sexualidade, culturas, etnias e outros. Não se pode pensar que a inclusão é exclusiva para os portadores de deficiência e que para esta acontecer basta adaptar o espaço físico e ter profissionais qualificados. Alem do espaço físico se faz necessário a preparação voltada para a diversidade rompendo as barreiras do preconceito. Perrenoud, (2002) menciona que esse é o caminho para profissionalização, uma vez que permitira o desenvolvimento da capacidade reflexiva desses profissionais, e assim encontrara meios para atuar com essa realidade, já que não existem fórmulas nem receitas.
            Nesse contexto as mudanças requerem profissionais atualizados e competentes preparados para atuar com diferentes problemas, comportamentos, dificuldades de aprendizagem primárias e secundárias, altas habilidades, deficiência, síndromes, entre outros.
            O fracasso escolar é um dos problemas que as instituições encontram nos dias atuais. Nessa perspectiva o fracasso escolar esta diretamente direcionado ao aluno, especialmente, as suas condições internas de aprendizagem. A escola considera o histórico familiar como causa da maioria dos casos de baixo desempenho escolar, lares desestruturados, pais que não acompanham os filhos e consequentemente crianças desinteressadas em aprender.
           

As dificuldades de aprendizagem referem-se a alguma desordem na aprendizagem geral da criança, provem de fatores reversíveis e normalmente não tem causas orgânicas. O desenvolvimento individual das crianças também é influenciado pela família, escola e comunidade.
                        O processo de aprendizagem não é considerado uma ação passiva de recepção, nem o ensinamento simples transmissão de informação. Esta aprendizagem supõe uma construção de conhecimento através do processo  mental e aquisição de novos conhecimentos, é uma reconstrução interna e subjetiva, processada e construída.
            Os seres humanos precisam de contínuas aprendizagens que começam a ocorrer a partir da gestação. O aprender é o caminho para atingir o crescimento, a maturidade e o desenvolvimento como pessoas num mundo organizado  e nas interações com o meio na organização desse conhecimento.
            A aprendizagem é um processo que ocorre durante toda vida segundo Alicia Risueño a aprendizagem, exige de quem aprende o corpo e o psíquico e os processos cognitivos que ocorrem dentro de um sistema social organizado, sistematizado em ideias, pensamentos, linguagem. (pág 32)
A escola deve então oferecer meios para que a criança vivencie seu processo de aprendizagem e a forma mais conveniente de trabalhar com as mesmas, como: planejar experiências e aprendizagens com propostas integradoras; relações frequentes com os pais e conhecer as possibilidades dos seus alunos, entre outras.
A criança deve sentir-se confiante e segura em relação à família e ao professor, para que possa sentir-se valorizada diante de suas ações, tendo credibilidade em seu potencial e sentindo  que pode aprender a partir de suas dificuldades.  
É fundamental que o professor trabalhe com a criança e não para ela servindo de referencia para a mesma. Faz-se necessário facilitar para que a criança se integre e consiga encontrar a solução por outro caminho, é indispensável que elas e seus pais mediante a intervenção inteligente do professor, recebam uma imagem integradora que conjugue o que sabe e o que não sabe fazer. O que pode e o que não pode. O que agrada e o que desagrada.
Somente a partir da capacidade do docente de pensar no melhor e mais saudável para a criança e sua família e, em segundo plano, nas dificuldades, poderá elaborar um plano que seja efetivo.
             


O desafio do trabalho docente frente às dificuldades de Aprendizagem

         Com o intuito de compreender melhor os diversos fatores causadores das dificuldades de aprendizagem, realizou-se uma entrevista com alguns profissionais da educação diretamente envolvidos nos casos mais específicos dos alunos do terceiro ano da Escola. Foram realizadas perguntas através de um questionário composto por questões abertas e fechadas. Participaram da entrevista: a professora regente da turma, a professora responsável pelas aulas de apoio e a coordenadora pedagógica responsável pelas turmas do Ensino Fundamental da escola.
Em suas concepções acreditam que os principais causadores das dificuldades de aprendizagem dos alunos dizem respeito à falta de interesse, compromisso e falta de estímulo (ambiente familiar inadequado à aprendizagem) e também a falta de pré-requisitos estabelecidos na escola. Contudo, isso acaba gerando conflitos entre educador e educando, escola e família tornando a ambos cada vez mais desmotivados e distantes.
A Escola oferece diversos tipos de materiais pedagógicos para auxiliar no processo ensino/aprendizagem como: material dourado, tampinhas, jogos pedagógicos, alfabeto móvel dentre outros e isso faz com que o educador tenha subsídios na complementação do seu trabalho. A coordenadora participa ativamente orientando e estimulando na concretização de um trabalho significativo tanto para o educador quanto para o educando.
 O grande anseio principalmente das professoras é o atendimento ao aluno no período de contra turno, mesmo a escola oferecendo horários diferenciados para sanar essas dificuldades não vem se obtendo resultados significativos devido às faltas dos alunos. A grande maioria reside em fazendas, dificultando a assiduidade nas aulas de reforço.
De acordo com a presente investigação essas educadoras acreditam que a maior dificuldade de aprendizagem detectada nos alunos está diretamente ligada a disciplina de língua portuguesa, dificultando assim a aprendizagem nas demais áreas, pois a leitura e interpretação são fundamentais para que o aluno desenvolva suas capacidades e habilidades.
A metodologia utilizada pelo professor no processo de ensino aprendizagem é um fator que interfere significativamente, pois cada criança tem seu tempo, suas necessidades e individualidades.
Uma metodologia e conteúdos inadequados para a idade/série podem acarretar desinteresse, desmotivação e conflitos na personalidade do aluno e interferir nas relações sociais e afetivas deste.
A Escola não oferece cursos de capacitação específicos para as dificuldades de aprendizagem, porém procura uma maneira de estimular em conversas a troca de ideias e sugestões de atividades.
Conforme questão levantada a respeito da nova forma de ensino implantada (ensino de nove anos), as respostas não foram unânimes em relação à diminuição das dificuldades de aprendizagem. A coordenadora acredita ser uma inovação positiva, desde que escola, família e comunidade se comprometam e andem juntos. A professora regente da turma onde se desenvolveu a pesquisa em questão vê de maneira positiva, pois dessa forma a criança inicia seu processo de aprendizagem mais cedo, mas, é claro que deve ser de maneira lúdica e prazerosa extinguindo qualquer tipo de rótulo, já para a professora responsável pelas aulas de apoio o ensino por si só não influencia e não é mais anos na escola que diminuirão essas dificuldades e sim a qualidade destinada a esse tempo.   

Cotidiano escolar e o olhar etnógrafo

Aqui neste espaço, vamos apresentar, mesmo que ainda timidamente, tendo em vista as limitações que envolvem a pesquisa nos cursos de graduação em nossa região, o relato da observação realizada dentro da proposta já evidenciada. Trata-se de um estudo observacional, descritivo e de caráter qualitativo, realizado a fim de interpretar o cotidiano escolar dos educandos com dificuldades de aprendizagem. O mesmo foi realizado por acadêmicos do curso de licenciatura plena em pedagogia da faculdade UNINOVA que tiveram nesse momento um duplo desafio, pois se depararam com a prática da etnografia que se caracteriza por uma observação extremamente fiel aos fatos e que impõe o desafio de não permitir ao pesquisador a emissão de juízos de valor baseados em seus sentimentos.  No espaço de sala de aula realizou-se dez horas de observação procurando acompanhar especificamente os casos previamente apresentados como sendo de dificuldade de aprendizagem.
            No início do ano letivo a referida turma contava com trinta alunos e no decorrer do ano muitos deles foram transferidos de escola, restando apenas treze alunos, destes, apenas um reside na cidade e os demais são provenientes das fazendas e sítios, dependendo de transporte para o deslocamento até a cidade.
Durante o acompanhamento da aula observou-se algumas dificuldades de aprendizagem tais como: falta de concentração, dificuldades de raciocínio lógico, dificuldade na leitura, entre outros.
            Na turma há “suspeita” de três casos de hiperatividade, porém somente um deles é comprovado e o aluno faz uso de medicamentos controlados, ainda segundo a professora regente da turma o descaso e abandono da família impedem que a escola encaminhe para um profissional habilitado para detectar inúmeros problemas que os alunos apresentam.
            De acordo com as observações feitas em relação ao caso comprovado de hiperatividade, percebeu-se que o mesmo domina grande parte do conteúdo na oralidade, porém apresenta dificuldades na escrita.
            Nota-se que a professora utiliza metodologia diferenciada com estes alunos, além disso, tenta estimulá-los na tentativa de superar seus próprios limites. Segundo ela isso seria mais fácil se os pais colaborassem e participassem da vida escolar dos filhos, incentivando e apoiando-os. Para a educadora o apoio dos pais é fundamental e serve como estímulo, pois o aprendizado também se dá em casa, um complementa o outro, é a união da escola e família cada um fazendo sua parte em beneficio da criança, para que a sua formação sirva de exemplo para a sociedade.
            A pedagoga trabalha com atividades diferenciadas como ditado, atividades para colorir, jogos educativos, todas voltadas para a alfabetização, em sua opinião o trabalho lúdico desperto o interesse do aluno e a mesma precisa estar trazendo sempre algo novo.
Portanto é preciso ter em mente e trazer para discussão as contribuições de Bossa(2000) quando  nos fala que   ao se tratar de problemas de aprendizagem escolar, de nada adiantam medidas como reforço ou aula particular apenas. Seria como combater a febre sem tratar a infecção. A identificação das causas dos problemas de aprendizagem escolar requer uma intervenção especializada. Essa questão permite muitos desdobramentos. Pode-se perguntar acerca do futuro da Escola frente às dificuldades de aprendizagem cada vez mais significativas no cenário da Educação. Pode-se perguntar como reorientar essa Escola para que ela reprograme-se no sentido de desempenhar novos papéis num mundo cambiante de valores e em constante crise. E pode-se ainda perguntar acerca dos novos papéis que os docentes precisam assumir frente às questões aqui levantadas e ainda pensar em que metodologias propor para atender a diversidade que temos presente em nossas salas de aula.


Nessa abordagem devemos ainda recorrer a Bossa quando esta autora argumenta que
[...] não é fácil para o professor tomar a decisão de encaminhar um aluno para atendimento. Essa decisão requer uma análise cuidadosa da situação e preparo deste profissional para lidar com a reação dos pais que muitas vezes passam a atacar o professor. Na verdade esse ataque consiste em um tipo especial de defesa é como se ao apontar a necessidade de auxílio para que se estabeleça o processo ensino aprendizagem, que se encontra obstaculizado, o professor estivesse responsabilizando os pais e o aluno pela problemática. (2000, p. 15,).
As interrogações aqui propostas não podem absolutamente serem consideradas definitivas. Elas são produto de reflexões coletivas que, essencialmente situaram-se no nível de discursos derivados de diferentes lugares, uma vez realizadas as observações em sala de aula, o que nos permitiu acompanhar o desenvolvimento de propostas pedagógicas e da interação entre professor e aluno, levamos o registro destas observações para discussão com o grande grupo de futuros pedagogos. Todas as observações foram registradas em um diário de campo que era elaborado ao final de cada observação, quando o grupo de acadêmicos pesquisadores retirava-se do ambiente de observação, nesse sentido afirma Santos que a pesquisa de inspiração etnográfica¹, nos permite olhar com a experiência de ter estado lá e escrito aqui. Desta forma conclui o autor:
A experiência etnográfica passaria por ter estado lá, tendo que descrever aqui (na volta da viagem), com o auxílio de cartões postais, de filmes, de fotografias, de objetos, de roupas típicas, entre outras coisas a cultura, a “realidade” lá observada. Isto é, a “realidade” constituída pelos olhos do etnógrafo, é através desta experiência que ele é autorizado a falar.  (Santos, 2005, p. 10, grifos do autor).
Mesmo a Escola sendo um terreno já conhecido, a prática da etnografia nos permitiu olhar para este cenário educativo com outros olhos, de outra posição, inicialmente é preciso obter o sim da escola, o sim da professora e ainda o sim dos alunos que estão sendo observados e embora sendo aceita a proposta estávamos ocupando ali uma posição que nos levava a certo estranhamento, pois certamente todos aqueles olhares dirigidos a nossa presença levantavam muitas indagações e sabíamos que nossa estada lá dependia de nossa capacidade de observar sem interferir no objeto de observação. Esta metodologia de investigação pressupõe que é somente através da imersão no cotidiano de outra realidade que se pode chegar a compreendê-la.
________________________________________

¹Utilizamos essa expressão por que não temos a pretensão de considerar esta investigação como sendo genuinamente etnografia pois ainda estamos construindo referenciais neste campo investigativo.
Ainda cabe aqui apresentar o que os professores que participaram desta pesquisa destacam quando questionados sobre as atividades destinadas a formação docente para atuar frente as dificuldades de aprendizagem, segundo estes o Estado disponibiliza formação na sala dos professores coordenada pelo CEFAPRO e cursos online, já uma outra profissional da mesma instituição disse que “sinceramente não” (grifo nosso), as discussões que ocorrem na sala do Professor durante os momentos de formação são apenas envolvendo questões burocráticas. Esta mesma profissional ao ser questionada sobre uma proposta de trabalho diferenciada para atuar junto aos alunos que apresentam alguma dificuldade de aprendizagem relatou não ter desenvolvido nenhuma proposta diferente por que os mesmos já têm as aulas de articulação uma vez na semana no horário contrário da aula.
Na perspectiva de Perrenoud, é necessário mais coerência e continuidade de uma aula para outra, além de um constante esforço de explicitação e de ajuste as regras do jogo. Ainda este autor nos fala que (2000, p. 65), “em uma pedagogia de situações problema o papel do aluno é implicar-se, participar, construir...”. E recorrendo novamente a Perrenoud, este nos diz que (2000, p. 65): “a aceitação dos erros dos alunos como fonte de progresso devem ser analisados e entendidos pelo professor”. Dessa forma podemos observar o quanto se torna complexa na medida em que estudamos e pesquisamos a atuação docente frente às dificuldades de aprendizagem, uma nova postura didático metodológico que envolva todos os atores que permeiam o espaço educativo.

Considerações e reflexões
Em geral, a criança aprende quando são oferecidas oportunidades adequadas para a sua aprendizagem, porém pode-se perceber que há uma série de fatores que podem desencadear o aparecimento dos problemas de aprendizagem dentre eles se encontram os fatores orgânicos, fatores específicos, fatores psicógenos e fatores ambientais.
A escola deve levar o reino do saber às crianças e para que isso ocorra se faz necessário que os cursos de capacitação e graduação tenham em seus currículos temas específicos de formação e embasamento para o profissional. Requer, também, maior disposição de recursos materiais e humanos, uma metodologia diferenciada que abranja conteúdos e objetivos funcionais para os alunos, e acima de tudo o respeito pela natureza da criança.
A “obrigação da aprendizagem” deve passar dos portões das escolas e chegar aos lares, como uma continuação e reforço do que se aprende na escola, pois a família deve estar inserida e compartilhar deste processo.
O dever é da instituição, mais especificamente do educador que deve ter subsídios de informação e capacitação para trabalhar com essa realidade mais comum que se imagina, contudo essa responsabilidade é de toda uma sociedade e deve ser compartilhada pelo todo nas ações e nos resultados obtidos.
Portanto, diversificar as situações de aprendizagem é adaptá-las às especificidades dos alunos, é tentar responder ao problema didático da heterogeneidade das aprendizagens, que muitas vezes é rotulada de dificuldades de aprendizagens. A maioria dos docentes recebeu uma formação centrada nos conhecimentos e sentem-se a vontade nesse modelo segundo Perrenoud (2000, p.82): “sua cultura e sua relação com o saber foram forjadas dessa maneira e eles aproveitaram tal sistema, pois seguiram sua caminhada”.
            È necessário um novo olhar para as  prática pedagógicas instituídas e o trabalho docente pois faz-se imperioso que o professor perceba a necessidade de criar vínculos com seus alunos através de atividades cotidianas que nos permitam construir e reconstruir segundo Perrenoud(2000a),as atividades de aprendizagem são, em princípio, apenas meios a serviço de finalidades que autorizam outras trajetórias, nessa perspectiva são supostamente escolhidas em função de uma teoria, daquilo que faz com se aprenda melhor e portanto progrida na formação.
Ainda podemos nos valer das palavras de Philippe Perrenoud (2000, p. 49) a esse respeito:
Para gerir a progressão das aprendizagens, não se pode deixar de fazer balanços periódicos das aquisições dos alunos. Eles são essenciais para fundamentar decisões de aprovação ou de orientação necessárias mais tarde. Esta não é sua única função, uma vez que também deve contribuir para estratégias de ensino-aprendizagem em um grau ou em um ciclo. Longe de constituir uma surpresa, esses balanços deveriam confirmar e aprimorar o que o professor já sabe ou pressente.
Todavia não basta conviver em sala com um aluno, nem observá-lo com atenção para afirmar se este possui ou não alguma dificuldade de aprendizagem é sim necessário que se repense as formações oferecidas aos docentes para que estas formações permitam formar e renovar uma equipe pedagógica que tenha neste encontros o suporte necessário para enfrentar e analisar em conjunto situações complexas, práticas e questões que envolvam realmente o processo ensino/aprendizagem. O conhecimento segundo Perrenoud, não nos permite controlar todos os acontecimentos, mas ajuda a antecipá-los, nomeá-los, desdramatizá-los, fazendo dessa forma com que possamos dispensar a busca de um bode expiatório chamado de “dificuldades de aprendizagem”, esse mito criado e alimentado no meio educativo tem se perpetuado. Sabemos da dificuldade que existe em abandonar um vicio uma verdade, um hábito, um chavão, mas é preciso rever como já dissemos anteriormente os espaços e conteúdos destinados a formação docente, nosso intuito é contribuir com alguns dados e sugestões para que se possa adicionar mais alguns elementos as reflexões e instropecções, pois sempre que nos apropriamos de novas informações damos inicio em mudanças significativas em nosso fazer docente. Em síntese, aprender é tarefa do aluno, independente do nível de conhecimento, ensinar é tarefa do professor, que deve desafiar no processo de reconstrução dos saberes e apoiar e intervir nas dificuldades em todo o momento.

Referências
ALVES,Rubem. A Escola que sempre sonhei sem pensar que pudesse existir. Editora Papirus. Campinas;São Paulo,2001.

BOSSA, Nádia. Dificuldades de Aprendizagem, o que são? Como tratá-las?Editora Artmed.Porto Alegre,2000.

COSTA, Marisa Vorraber;BUJES Maria Isabel(Orgs). Caminhos Investigativos III- Riscos e possibilidades de pesquisar nas fronteiras.Editora DP&A,Rio de Janeiro, 2005.

DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. 6ª edição. Campinas, SP: autores associados Ltda, 2003.

FÀVERO,Eugênia Augusta Gonzaga,  et all. Atendimento Educacional Especializado. Aspectos Legais e Orientações Pedagógicas. SEESP/SEED/MEC. Brasília/DF,2007.

GAMES, Ana Maria Salgado. Dificuldades de Aprendizagem. Ed. Grupo Cultural.

GIKOVATE, Flávio.A arte de Educar.Nova Didática, Curitiba,2001.

TONINI, Andréa. Cadernos de educação especial.

PERRENOUD, Philippe. 10 Novas Competências para Ensinar. Editora Artmed.Porto Alegre,2000.
___________________. Construir as Competências desde a Escola. Editora Artmed,Porto Alegre,2000.

ROPÈ,Françoise;TANGUY, Lucie(Orgs). Saberes e competências.Editora Papirus,Campinas São Paulo,1997.

Polissemia dos termos: poder, cultura e narrativas... Uma reflexão


Janete Rosa da Fonseca¹

                               



RESUMO: O exercício do poder, ou seja, a expressão de influências entre pessoas, instituições e culturas de modo a determinar o rumo que tomam e as ações que promovem, constitui um fenômeno natural e inerente às interações que ocorrem em qualquer organização social. A escola não é exceção e é neste espaço que podemos muitas vezes perceber a proliferação de atitudes e discursos. A narrativa é um gênero do discurso que pode configurar-se em um instrumento desencadeador de relações assimétricas de poder que se expressam na construção da cultura escolar.

Palavras-chave: Poder-narrativa- cultura- escola




            Este trabalho propõe-se a realizar uma breve reflexão sobre as narrativas que circundam o espaço escolar e o que estas narrativas buscam construir ou desconstruir entre os sujeitos. Encontramos, em determinados momentos, um atravessamento de poder nos espaços escolares, momentos estes em que as narrativas constituem o espaço e o momento de sala de aula.

            Há alguns anos, a educação era um bem para poucos e mantinha privilégios de elite. Avançou-se muito, incluíram-se quase todos, mas as relações de poder existentes perpetuam-se através de questões subjetivas que denotam o atravessamento de situações. A escola é vista como espaço legitimador da cultura através das narrativas que constituem seu espaço.
           



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¹ Licenciada em Pedagogia, Mestre em Educação, aluna do Programa de pós-graduação em educação da UFRGS.



Dentro dessas narrativas podemos muitas vezes detectar o exercício de poder no momento em que não reconhecemos o outro e sua cultura, passando neste instante a desautorizá-lo assim como afirma Silveira²,

...dentro do ambiente escolar dedicado á escolarização, outros espaços se
                        abrem com freqüência às narrativas como é o caso dos conselhos de classe
onde narrativas particulares “constroem os alunos”, de certa forma de ma-
neira similar aos tribunais do júri (afinal narrativas pregressas sobre um a-
cusado podem apontar para o delineamento de uma personalidade doentia)
ou a mídia, onde de forma tão freqüente, pública e por vezes espetaculari-
zada se constroem personagens (p. 201,2005)


Muitas dessas narrativas dizem respeito às histórias que ocorrem nos espaços escolares, pode-se analisar de quantas formas se conta uma vida, vida essa que quando diz respeito a nossa história nos encanta e incita a contá- la, ouçamos as palavras de Arfuch³


La percepción del carácter configurativo de las narrativas, en especial
las autobiográficas y vivenciales, se articula, casi de modo implícito,al
carácter narrativo de la experiencia. La relación entre temporalidad   y
experiencia, crucial para la historia, remite tanto a un pasado que impone
su huella como a una anticipación hacia lo imprecedible.Doble momiento
que es también, recordemos, el que acompaña el trabajo- el intervalo de la identidad  narrativa ( p.92,2001)


Desta forma podemos perceber que existe uma certa recorrência de algumas temáticas que são culturalmente privilegiadas no espaço escolar e que, certamente, estas não dizem respeito a nossas histórias de vida, assim como não são bem vindas nossas histórias de sucesso ou fracasso. Ou seja, o que é contável desloca-se, transforma-se, varia conforme a situação e o local onde estamos.

A cultura é alimentada, criada, produzida, reforçada e por vezes subvertida pelas narrativas com protagonistas pontuais em circunstâncias e lugares datados, neste momento como nos fala Silveira, “algumas narrativas culturais foram explicitamente generalizadas, como o lastro comum da cultura ocidental, que como sabemos, é branca, européia, masculina, colonial,..”(p.199,2005).

E assim muitas vezes são construídas as relações de poder no espaço escolar, cujas narrativas tanto nas salas dos professores, quanto nos conselhos de classe fazem alusão aos alunos, como “o clarinho’, “o bonitinho”, considerando que o poder é uma rede de relacionamentos sempre existirão relações de poder em espaços onde a cultura produz sujeitos e determina sua conduta frente as mais diferentes situações. Existe uma idéia de normatização da conduta destes sujeitos a partir das narrativas que são tecidas sobre eles e sobre suas histórias de vida, histórias estas que acabam por legitimar sua conduta.

Não proponho nesse ensaio uma análise simplista de como as narrativas se constituem, mas baseando-me na proposta de Rosa Maria Hessel da Silveira, proponho uma reflexão de como estas narrativas podem favorecer algumas práticas escolares, assim como a  estabilidade de identidades e representações produzidas por essas praticas. Assim nos fala Silveira:


... os textos pertencentes ao ordenamento legal da educação, as teorias e
recomendações pedagógicas, as grandes palestras, os livros-texto de di-
vulgação das concepções pedagógicas, se esses discursos adotam por
princípio um formato textual de caráter mais generalizante, dissertativo,
expositivo, judicativo,etc, as práticas culturais cotidianas, nas casas, na 
rua, nos lugares de trabalho e  de lazer, nos clubes de futebol, na mídia
se valem é de pequenas narrativas, de     textos  particulares que narram
eventos, fazem protagonistas agirem em ambientes e tempos, apresentam
circunstancias, apontam causalidades ou contigüidades ( que ás vezes re-
sultam em causalidades). Quanto á mídia, basta relembrar as revistas de
fofocas, sempre com grande êxito de leituras, mas sem esquecer também
das revistas semanais, de informação, as histórias “exemplares” de quem
se fez sozinho, de quem “migrou e venceu” ou de quem “migrou” e fracassou
de quem “errou e se redimiu” ou de quem “errou e se afundou”, e assim por
diante.”(p.199,2005)”.

Todas estas formas de narrativas se estabelecem na Escola, em um espaço pedagógico em que muitas vezes precisamos aprender a lidar com determinadas situações, como a que nos apresenta Silveira, numa discussão sobre as narrativas que constituem o momento destinado à participação dos alunos em discussões que preconizam esta prática.


Como vemos o aluno, que sempre quer trazer sua contribuição ao tema, através de momentos narrativos que buscam contar algo sobre os pais, os avós, a sua casa, ou seu trabalho? Retomo as palavras de Silveira, quando nos fala que, “ talvez este aluno ainda não tenha sido eficientemente enquadrado, nas regras do discurso escolar, acadêmico e portanto não sabe que histórias particulares não interessam ? ou as vemos como marcas de uma cultura aldeã, paroquial, de vizinha de cerca, que faz fofocas do cotidiano e que não sabe se tornar cosmopolita, moderna, civilizada, enfim, convenientemente educada?” (p.200,2005).

______________________________________________________________

² SILVEIRA, Rosa Maria Hessel. Discurso, Escola e Cultura: Breve roteiro para pensar narrativas que circundam e constituem a Educação, p. 199-200, 2005.
³ ARFUCH, Leonor. El Espacio Biográfico. Dilemas de la Subjetividad contemporánea, p..92, 2001.

A autora nos mostra, com essas considerações, que estes alunos com suas contribuições estão contando uma segunda história, momento em que tentam exibir a compreensão dos fatos, porém correm o risco de não serem capazes de refletir de acordo com o intuito do professor, gerando assim um insucesso na busca da intersubjetividade.

Porém, nos relembra a autora, esta segunda história tão obviamente motivada pode não ser percebida com satisfação pelo professor conforme sua hierarquia de valores. Esta é mais uma possibilidade que se abre às narrativas na construção do espaço escolar dos sujeitos que os freqüentam.

As narrativas podem ainda ser apresentadas como instrumento de persuasão, como os trechos bíblicos, as histórias infantis, os depoimentos de sucesso, enfim o reforço da exemplaridade, através de narrativas que moldam condutas e forjam estereótipos. O de como devo agir para ser considerado bom ou mau, como devo me transformar para tornar-me o modelo ideal que o espaço que quero ocupar na sociedade exige.

Qual é o modelo de família perfeita? Podemos também encontrar resposta para essa indagação através das narrativas, que constituem imagens e representações do que é perfeito, belo e forte.


Além de vermos as narrativas como uma maneira de (des)construir os sujeitos e de reforçar e/ou perpetuar relações de poder no espaço pedagógico, Silveira, nos diz que “as narrativas também podem servir como testemunho da experiência vivida e essa narrativa da experiência como legitimadora de uma determinada identidade, de uma alegada competência”.(p.206,2005)


Ainda Silveira (2005), nos fala que no campo pedagógico, vale relembrar o quanto as narrativas e histórias das experiências valorizam, temperam e consagram determinadas imagens, a imagem de professor, de aluno, o “aluno inteligente’, aquele que nunca estudou, mas sempre se saiu bem, o que é ordeiro, disciplinado, que acumula pequenas vitórias, todos estes sujeitos tem suas atuações realimentadas pelas narrativas particulares correntes que perduram, se reforçam, se multiplicam e resistem até que outras narrativas contrárias as sobrepujem.


Para finalizar as reflexões contidas nesse ensaio, cabe ressaltar que as narrativas são muitas vezes a expressão de influência entre pessoas, instituições e culturas e que devemos evitar que o espaço escolar reproduza a sociedade em suas diferenças e desigualdades, deixando  de ser um espaço de construção do saber.


As narrativas que constituem o espaço escolar devem atentar aos significados que estão atrelados, para o sujeito que está ouvindo e para o que narra.

Para finalizar, reporto-me a Silveira (2005) que diz “que a escola está plena de histórias, construindo imagens de escola, imagens de aluno, imagens de conhecimento escolar, enfatizando contornos e esfumaçando outros, fixando personagens, apagando diferenças, pondo em relevo outras, riscando fronteiras, confinando  grupos... desenhando práticas  e delineando perfis.”


Assim sendo, ninguém é privado, havendo espaço para todos, já que todos são sujeitos construtores de uma cultura legitimadora de sua história.





   REFERÊNCIAS:



ARFUCH, Leonor. El espacio biográfico- dilemas de la subjetividad contemporanea.
Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica. 2001

_______.(org) Identidades, sujetos y subjetividades. Buenos Aires; Prometeo Libros,2002.

SILVEIRA, Rosa Maria Hessel.(org). Cultura, poder e educação; Editora da ULBRA, 2005.